sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Uma linda vista de vale verde

Isis Valverde

Grande mídia mostra seu lado mais reacionário

20 de agosto de 2010 às 1:18

Weissheimer: O passado e o presente da imprensa brasileira

O passado e o presente da imprensa brasileira
A revista Época fez o que se espera da Globo, um dos pilares de sustentação da ditadura militar: resgatou a agenda da Guerra Fria e destacou na capa o “passado de Dilma”. O ovo da serpente permanece presente na sociedade brasileira. O que deveria ser tema de orgulho para uma sociedade democrática é apresentado por uma das principais revistas do país com ares de suspeita. Os editores de Época honram assim o passado autoritário e anti-democrático de sua empresa e nos mostram que ele está vivo e atuante. No RS, jornal Zero Hora aplaude suspensão de indenizações às vítimas da ditadura e fala do risco de instituir uma “bolsa anistia”.
Marco Aurélio Weissheimer, na Carta Maior

As empresas de comunicação têm o hábito de se apresentarem como porta-vozes do interesse público. Em que medida uma empresa privada, cujo objetivo central é o lucro, pode ser porta-voz do interesse público? Essas empresas participam ativamente da vida política, econômica e cultural do país, assumindo posições, fazendo escolhas, pretendendo dizer à população como ela deve ver o mundo. No caso do Brasil, a história recente de muitas dessas empresas é marcada pelo apoio a violações constitucionais, à deposição de governantes eleitos pelo voto e pela cumplicidade com crimes cometidos pela ditadura militar (cumplicidade ativa muitas vezes, como no caso do uso de veículos da ão Paulo durante a Operação Bandeirantes). Até hoje nenhuma dessas empresas julgou necessário justificar seu posicionamento durante a ditadura. Muitas delas sequer usam hoje a expressão “ditadura militar” ao se referir aquele triste período da história brasileira, preferindo falar em “regime de exceção”. Agem como se suas escolhas (de apoiar a ditadura) e os benefícios obtidos com elas fossem também expressões do “interesse público”.
Apoiar o golpe militar que derrubou o governo Jango foi uma expressão do interesse público? Ser cúmplice de uma ditadura que pisoteou a Constituição brasileira, torturou e matou é credencial para se apresentar como defensor da liberdade? O silêncio dessas empresas diante dessas perguntas já é uma resposta. O que é importante destacar é que a semente do autoritarismo, da perversidade e da violência prossegue ativa, conforme se viu neste final de semana (e se vê praticamente todos os dias).
A revista Época fez o que se espera da Globo, maior empresa midiática do país e um dos pilares de sustentação da ditadura militar: resgatou a agenda da Guerra Fria e destacou na capa o “passado de Dilma”. O ovo da serpente permanece presente na sociedade brasileira. O que deveria ser tema de orgulho para uma sociedade democrática é apresentado por uma das principais revistas do país como motivo de suspeita. Os editores de Época honram assim o passado autoritário e anti-democrático de sua empresa e nos mostram que ele está vivo e atuante.
Indenizações às vítimas da ditadura
De maneira similar, aqui no Rio Grande do Sul, o jornal Zero Hora publicou um editorial apoiando a decisão do TCU de questionar às indenizações que estão sendo pagas às vítimas de perseguição e maus tratos durante a ditadura, ou “regime de exceção”, como prefere a publicação. Trata-se, segundo a RBS, de defender um “princípio da razoabilidade”. “Ninguém tem direito a indenizações perdulárias ou a aposentadorias e pensões que extrapolam critérios de prudência, ponderação e equilíbrio”, diz o texto. Prudência, ponderação, equilíbrio e razoabilidade: foram esses os valores que levaram o jornal e sua empresa a cerrarem fileiras ao lado dos militares que rasgaram a Constituição brasileira? Quanto dinheiro os proprietários da RBS ganharam com esse apoio? Não seria razoável e ponderado defender que indenizassem a sociedade brasileira pelo desserviço que prestaram à democracia?
É cansativo, mas necessário relembrar. Sempre. Como a maioria da grande mídia brasileira, a empresa gaúcha apoiou o golpe que derrubou João Goulart. O jornal Zero Hora ocupou o lugar da Última Hora, fechado pelos militares por apoiar Jango. Esse foi o batismo de nascimento de ZH: a violência contra o Estado Democrático de Direito. Três dias depois da publicação do Ato Institucional n° 5 (13 de dezembro de 1968), ZH publicou matéria sobre o assunto afirmando que “o governo federal vem recebendo a solidariedade e o apoio dos diversos setores da vida nacional”. No dia 1° de setembro de 1969, o jornal publica um editorial intitulado “A preservação dos ideais”, exaltando a “autoridade e a irreversibilidade da Revolução”. A última frase editorial fala por si:
“Os interesses nacionais devem ser preservados a qualquer preço e acima de tudo”.
Interesses nacionais?
A expansão da empresa se consolidou em 1970, com a criação da RBS. A partir das boas relações estabelecidas com os governos da ditadura militar e da ação articulada com a Rede Globo, a RBS foi conseguindo novas concessões e diversificando seus negócios.
Como a revista Época, Zero Hora é fiel ao seu passado e exercita um de seus esportes favoritos: pisotear a memória do país e ofender a inteligência alheia. O editorial tenta ser ardiloso e defende, no início, as indenizações como decisão correta e justa. Mas logo os senões começam a desfilar: os exageros nas indenizações de Ziraldo, Lula, Jaguar e Carlos Lamarca, “outro caso aberrante segundo o procurador”. A pressão exercida por setores militares junto ao governo e ao Judiciário é convenientemente omitida pelo editorial que fala do “risco” de as indenizações se transformarem em algo como “uma bolsa-anistia”.
O presidente da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão Pires Junior, divulgou uma esclarecedora nota a respeito da decisão do TCU e das pressões que vem sendo exercidas contra o processo das indenizações. A capa da revista Época e o editorial de Zero Hora mostram que as empresas responsáveis por essas publicações permanecem impregnadas do autoritarismo que alimentou seu nascimento e expansão. É triste ver jornalistas emprestando sua pena para inimigos da democracia e da liberdade. Pois é exatamente disso que se trata. Esse é o conteúdo que habita a caixa preta de boa parte da imprensa brasileira.

O fim da oposição de direita abre espaço para a oposição de esquerda

Bom texto encaminhado pelo professor Dalmir Francisco.

O desdobramento das pesquisas eleitorais
A frente PSDB-DEM deve sofrer um duro golpe nas eleições deste ano,
prevê João Francisco Meira, diretor presidente do Vox Populi. Vai
sobrar Aécio Neves, em Minas, Kátia Abreu em Tocantins, talvez Roseane
Sarney (embora no PMDB) no Maranhão. Cesar Maia corre o risco de não
se eleger, assim como Agripino Maia e outros caciques. A nova geração
de centro-direita, esperança de um revigoramento da oposição, será
arrasada nas eleições. Levará no mínimo oito anos para se recompor a
oposição, com todos os inconvenientes que trará para o aprimoramento
democrático do país. O artigo é de Luis Nassif.
Luis Nassif
A grande tragédia política dessas eleições será o fim quase completo
da frente PSDB-DEM, a única que poderia oferecer uma oposição
consistente ao novo governo, que será empossado em 1º de janeiro de
2011.
Não existe governo, por mais virtuoso, que resista a um mandato sem
oposição. E este é o risco que o Brasil corre, com os erros cometidos
pela oposição nas atuais eleições. A avaliação é de João Francisco
Meira, diretor-presidente do Instituto Vox Populi.
Em meados do ano passado, a partir de conversas com Meira e de
reflexões próprias, parlamentares do DEM – como o ex-deputado Saulo
Queiroz – alertaram para as dificuldades que haveria em uma provável
candidatura José Serra. Estava claro para eles a quase impossibilidade
de vitória de Serra, por um conjunto de fatores.
O alerta de nada adiantou.
Em março, durante Congresso da Associação Brasileira de Empresas de
Pesquisa (ABEP), Meira alertou mais uma vez que a eleição já estava
decidida para Dilma Rousseff. Tanto o Vox Populi quanto o Instituto
Sensus trabalhavam com modernas técnicas de pesquisa, visando
antecipar tendências do eleitorado.
A metodologia era simples. Parte relevante do eleitorado não sabia
ainda que Dilma era candidata de Lula. Mas certamente saberá no dia
das eleições. A técnica consistia em antecipar aos pesquisados as
informações. A partir daí, se chegaria a um resultado muito mais
próximo do resultado final das urnas.
No encontro, houve um forte questionamento do Instituto Datafolha,
para quem pesquisas não deveriam antecipar tendência.
É uma bela discussão conceitual. O que interessa em uma pesquisa
eleitoral: saber qual o resultado se a eleição fosse hoje ou tentar
antecipar o resultado final da eleição? A fronteira da pesquisa de
mercado é justamente antecipar tendências, explica Meira.
Nos meses seguintes, um inferno se abateu sobre os Institutos que
seguiram essa nova metodologia – Sensus e Vox Populi. Foram atacados
pelos jornais.
O momento mais dramático dessa história foi quando, estimulado pelas
matérias da Folha, o PSDB entrou na justiça eleitoral exigindo a
auditagem da pesquisa do Sensus. O Instituto amanheceu com um
estatístico convocado em São Carlos, com a polícia, para garantir a
vistoria, e com um repórter da Folha (empresa proprietária do
Datafolha) para escandalizar o acontecimento.
Não se encontrou nenhuma irregularidade na pesquisa. Mais que isso, à
medida que os dias iam passando, confirmava-se integralmente o acerto
do Sensus e do Vox. O próximo desafio de Meira será produzir um
trabalho acadêmico a respeito das conseqüências do viés das pesquisas.
Em um primeiro momento, aumentou a desinformação da opinião
pública.Agora, há muita gente perplexa com um resultado que já era
previsível desde o ano passado.
Ao comprar a ideia de que Serra era competitivo, contra toda a
evidência de um ano atrás, a oposição acabou indo para o caminho que
Lula queria.Meira equipara esse episódio às grandes tragédias
shakespeareanas, de desdobramentos terríveis quando se toma a decisão
errada na política, na guerra e no amor. Os fatos acabam voltando no
meio da sua testa, com fúria redobrada.
Caminhos alternativos
Se não se tivesse embarcado nessa armadilha das pesquisas com viés, a
oposição teria tomado outro caminho. Constataria que Lula inaugurou um
novo tempo na política brasileira e tentaria se adequar a esse novo
cenário, pensando em um pacto progressista, que permitisse reformas
estruturais do Judiciário, reforma fiscal, estrutura tributária. Não
venceria as eleições, mas sairia preservada.
A queima das caravelas
Em vez disso, queimaram-se as caravelas e se chegou ao final da
tragédia, com a aniquilação quase completa da estrutura DEM-PSDB. Vai
sobrar Aécio Neves, em Minas, Kátia Abreu em Tocantins, talvez Roseane
Sarney (embora no PMDB) no Maranhão. Cesar Maia corre o risco de não
se eleger, assim como Agripino Maia e outros caciques. A nova geração
de centro-direita, esperança de um revigoramento da oposição, será
arrasada nas eleições.
O final da tragédia
Levará no mínimo oito anos para se recompor a oposição, com todos os
inconvenientes que trará para o aprimoramento democrático do país. O
final da tragédia será em São Paulo. Geraldo Alckmin será eleito,
possivelmente com folga. Mas há grande probabilidade de Serra perder
no seu próprio estado, a partir do qual se produziu a fantasia que
liquidou com a oposição em todo país.